Belém do abandono
Na viagem de retorno do sul do país, em junho deste ano, sentei
ao lado de uma senhora muito agradável, aposentada, residente em Porto Alegre
que vinha pela primeira vez a Belém. Durante o voo, conversamos sobre Belém e
era visível a expectativa positiva dela em relação a cidade.
Eu, constrangida, tentava não falar mal da nossa cidade, mas ao mesmo tempo não
conseguia ratificar as qualidades de Belém, citadas por ela, sem sentir que
estava faltando com a verdade.
Como dizer a ela que é
praticamente impossível andar em nossa cidade, sem correr o risco de ser
assaltada a cada esquina? Como prepará-la para a visão de uma cidade
abandonada, onde uma das avenidas mais centrais e, com certeza, a mais bonita, a
Avenida Nazaré, tem suas calçadas permeadas por buracos e ocupadas por
ambulantes, que ali chegam e se instalam sem serem incomodados por ninguém?
Como dissuadi-la de passear na Praça da República, pois lá os espaços estão ocupados
por drogados e desocupados? Como
justificar para ela a falta de parques públicos para lazer da população? Como
justificar o baixo índice de arborização da cidade que é a porta de entrada da
Amazônia, o tal pulmão do mundo? Como levá-la ao famigerado “Portal da Amazônia”
sem ter justificativa para a miséria ao redor?
É fato que Porto Alegre e outras metrópoles também têm suas
dificuldades, afinal estamos no Brasil, mas, talvez por morar aqui e acompanhar
as notícias e o caso que se instalou na cidade, tenho a certeza inabalável de
que a gestão pública em Belém nos últimos 10 anos foi a pior do Brasil. Somos uma
cidade sem lei e sem ordem. Uma cidade onde a desigualdade social de certa
forma justifica e alimenta a desordem.
Por isso cresce em mim uma sensação de impotência e culpa por
fazer parte de uma parcela da sociedade, que tem completa noção do que aqui
ocorre mas se queda calado, em parte por não encontrar saída, em parte porque de
certa forma está protegida pela sua posição na pirâmide social.