De olhos bem abertos




Ainda sobre emendas parlamentares, para aqueles que não dominam muito bem o assunto, é bom lembrar que uma emenda parlamentar é um instrumento utilizado pelo Poder Legislativo (municipal, estadual ou federal) que visa acrescentar, alterar ou suprimir recursos do orçamento apresentado pelo poder executivo. As emendas podem ser individuais ( Cada Deputado tem uma cota) e coletivas ( apresentadas por grupo de parlamentares). 


Em tese, as emendas servem para o Parlamentar atender a demanda do povo que representa na Câmara ou no Senado. Como são emendas ao orçamento, o recurso proveniente da emenda é direcionado para determinada Secretaria, Prefeitura ou órgão responsável para atender a política pública a que se destina.



Na esfera federal, todos os dados sobre as emendas ao orçamento estão disponíveis no Portal da Transparência em " consulta detalhada/emendas parlamentares."

A maneira mais fácil de consultar é  por autor e por período. É possível ver até mesmo o empenho  da despesas, bem como o pagamento. 

Enquanto isso, por essas bandas de cá, não há informação disponível sobre as emendas dos deputados estaduais. Apenas em algumas publicações no Diário Oficial do Estado ou em alguns empenhos é possível saber que determinado recurso é proveniente de emenda, mas não se sabe de qual deputado.

Emenda é dinheiro carimbado para determinada finalidade pública selecionada pelo propositor, mas isso não significa que na hora da contratação seja possível direcionar o recurso para determinadas pessoas.

A falta de transparência propicia a ocorrência de situações como as que vêm sendo relatadas neste blog e em vários outros, notadamente no blog do jornalista Lúcio Flávio Pinto: Muito dinheiro de emendas parlamentares caindo no bolso de algumas pessoas/empresas, sem licitação, sob o argumento de que se trata de inexigibilidade de licitação. Ocorre que o Tribunal de Contas da União já manifestou sobre o assunto, com o seguinte posicionamento:


Cartas de exclusividade a empresas intermediárias de artistas não atendem à condição para contratação direta por inviabilidade de competição prevista na Lei de Licitações. Deve haver a comprovação do recebimento dos valores cobrados pelos artistas.

Esse foi o entendimento firmado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) ao analisar tomada de contas especial (TCE) instaurada pelo Ministério do Turismo (MTur), por irregularidades em contratação sem licitação em Barra da Estiva, no Estado da Bahia. A TCE foi instaurada devido à contratação direta por inexigibilidade de licitação, de empresa para realização da Festa do Café, em 2009.

À época, a ex-prefeita apresentou carta e declarações de exclusividade, firmadas pelos representantes das cinco atrações artísticas que participaram do evento, a fim de justificar a contratação sem licitação.

O Tribunal, no entanto, firmou jurisprudência, por meio do Acordão 1.435/2017-Plenário, de que a apresentação apenas de autorização, atesto ou carta de exclusividade referente à exclusividade do artista para o dia correspondente à sua apresentação não atendia aos requisitos da Lei de Licitações.
A avaliação do Tribunal levou em consideração que a Lei de Licitações não considera como empresário exclusivo qualquer pessoa ou empresa munida de documento que lhe confira essa condição por algumas horas. Pelo contrário, isso deve ser inferido a partir de uma longa relação com o artista, de uma larga interação profissional.
Para o TCU, é inexigível a licitação nas hipóteses em que houver inviabilidade de licitação. Não há, portanto, inviabilidade de licitação nos casos de contratação de empresa para intermediar a contratação de artistas. Pelo contrário, os processos julgados pelo TCU mostram a existência de diversas promotoras, por todo o país, aptas a organizar eventos e a contratar artistas.

Na avaliação da Corte de Contas, a ausência de licitação entre as promotoras de eventos, com a inexigibilidade de licitação, gera o desvio de recursos públicos federais em favor de grupos. A fiscalização detectou que a quase totalidade dos valores é absorvida, de forma ilegal e criminosa, por detentores de cartas de exclusividade que, na prática, transferem aos artistas frações pouco significativas do montante de recursos públicos federais efetivamente transferidos.


A análise das contratações aqui em nosso Estado não deixa dúvida de que umas poucas empresas vêm sendo contratadas, sem licitação, e recebendo recursos vultosos transferidos diretamente do Orçamento do Estado, por meio de emendas parlamentares. Cita-se como exemplo, a empresa CLEBER HENRIQUE ALMEIDA FIGUEIREDO. CNPJ 30.169.217000190. Segundo o cadastro da Receita Federal a referida empresa foi aberta em 11/04/2018 e tem como atividade econômica, o serviço de organização de feiras, congressos, exposições  e festas. No mesmo ano, no período de 20/06 a 04/07/2018, a empresa recebeu R$ 300.000,00 da Fundação Cultural do Pará. Não há registro no empenho do serviço contratado e nem publicação no Diário Oficial do Estado. Em 2019, a empresa recebeu da FCP  R$ 1.581.000,00 até 26/08/2019.

Registros no Diário Oficial do Estado indicam que a empresa foi contratada, por inexigibilidade de licitação, para agenciar e contratar artistas da terra para apresentações. Conforme exemplos:

1) Valor: R$ 12.000,00 .OBJETO: Contratação da empresa CLEBER HENRIQUE ALMEIDA FIGUEIREDO 74018299249 (CNPJ Nº 30.169.217/0001-90), para viabilizar a participação do profissional do setor artístico AURINO PINDUCA QUIRINO GONÇALVES, na programação do 19º Festival da Pororoca, no Município de São Domingos do Capim, no dia 23/03/2019. ORÇAMENTO: Projeto Atividade: 8421-0101000000-339036, PTRES:158421, PI:2120008421C, AÇÃO:254565, FUNCIONAL PROGRAMÁTICA: 13.392.1444-8421. CONTRATADO: CLEBER HENRIQUE ALMEIDA FIGUEIREDO 74018299249. ORDENADOR: Bruno Chagas da Silva Rodrigues Ferreira.

2) INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO Nº 139/2019 Nº PROCESSO: 2019/416571 VALOR: R$ 50.000,00

Emenda Parlamentar: 19EMEN00243

Artigo 25, Inciso III, da Lei 8.666/93

Objeto: Pagamento de cachê artístico para os artistas/representantes Leo Meneses, Rayssa Abrahão, JP Tubarão e Recorda Som por suas apresentações no evento “PARACURI MUSICAL”, no dia 06 de Setembro de 2019, na Feira de Artesanato do Paracuri, no Distrito de Icoaraci, Município de Belém-PA.

Contratada: CLEBER HENRIQUE ALMEIDA FIGUEIREDO 74018299249 – CNPJ: 30.169.217.0001-90

Projeto Atividade: 8423 / Fonte: 01010000 /Elemento de despesa: 339039 Ordenador: João Augusto Vieira Marques Junior.


Portanto, trata-se de uma empresa que providencia a contratação dos artistas, serviço que poderia ser feito por diversas agências aqui instaladas. Assim, ao invés de contratar diretamente poucas e determinadas empresas, o correto seria a FCP fazer um pregão ou credenciamento de empresas que se encarregariam de contratar os artistas, sob um determinado pagamento, estipulado pela Fundação, tanto quanto o cachê do artista como o da agenciadora, que seria escolhida com base no menor preço ofertado para fazer o serviço.


Assim, fica evidente que há um direcionamento/favorecimento de empresas no uso dessas verbas provenientes de emendas parlamentares na área da cultura. Resta saber como esse direcionamento ocorre. Os favorecidos ( empresas intermediárias/agenciadoras) já vêm carimbados junto com a verba pública ou são escolhidos ali, na Fundação Cultural, à revelia dos deputados?

Essa prática danosa tem que parar, bem como é preciso apurar se houve, de fato, a correta aplicação dos recursos públicos.

Com a palavra o Ministério Público do Estado, constitucionalmente encarregado de defender a democracia, as leis, o patrimônio público.


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